26/03/2015

Recomendação n.º 2/2015 Recomendação sobre Retenção Escolar nos Ensinos Básico e Secundário



Do conhecimento adquirido relativamente à problemática da retenção escolar A problemática da retenção no sistema educativo português assume contornos preocupantes, quer pela expressão, quer pela manifesta ineficiência e ineficácia desta medida para a melhoria do desempenho escolar dos alunos. Considerando a importância que reveste esta questão, já sinalizada no Estado da Educação 2013, entendeu o Conselho Nacional de Educação desenvolver um processo de reflexão e análise sobre a retenção escolar com o objetivo de conhecer melhor os contornos desta problemática, bem como apresentar caminhos que possam conduzir à alteração da cultura de retenção vigente no sistema educativo português. 

A reflexão produzida e as recomendações constantes do presente documento são fundamentadas pelo relatório técnico, que o complementa.

Anualmente, mais de 150 000 alunos do sistema educativo português ficam retidos no mesmo ano de escolaridade. De acordo com os dados do PISA 2012, cerca de 35 % dos jovens portugueses com 15 anos tinham já sido retidos pelo menos uma vez, contra a média OCDE de 13 %, e mais de 7,5 % apresentam no seu percurso mais de uma retenção. Verifica -se, ainda, que os resultados destes alunos nestas provas são significativamente inferiores aos dos alunos que nunca foram retidos, o que poderá significar que o(s) ano(s) de repetência não permitiu/permitiram uma recuperação de aprendizagens, como é o objetivo subjacente à medida da retenção escolar. No entanto, a investigação demonstra que alunos retidos, nomeadamente nos anos iniciais da escolaridade, não melhoram os seus resultados e são mais propensos a uma nova retenção para além da evidente associação, sustentada na literatura, entre a retenção e o aumento dos níveis de desmotivação, indisciplina e abandono escolar.

Regista -se, ainda, que existe uma maior probabilidade de retenção de alunos com piores condições socioeconómicas, bem como de alunos provenientes de países estrangeiros. Tal constatação permite -nos inferir que a aplicação da medida da retenção poderá agravar as situações de iniquidade no sistema educativo.

Embora na legislação em vigor a retenção seja assumida como uma medida a ser aplicada “a título excecional” (Decreto -Lei 139/2012, de 5 de julho), na prática, a situação que conduz à decisão de retenção é bastante mais frequente do que um carácter de excecionalidade faria prever e é utilizada, muitas vezes, como forma de pressão para obter determinados comportamentos dos alunos e como punição para aqueles que não cumprem o esperado pela escola em relação à aprendizagem.

Sabe-se, ainda, que a retenção potencia comportamentos indisciplinados, fruto de uma baixa autoestima, desenquadramento em relação à turma de acolhimento, o que dificulta, ainda mais, a aprendizagem. Esta situação favorece, ainda, a emergência de alunos com lideranças divergentes da cultura escolar, que contaminam os pares e o ethos das turmas.

Assim, embora na sua génese a retenção tenha como pressuposto a criação de uma oportunidade adicional para a melhoria das capacidades e do nível de aprendizagem dos alunos, esta comporta problemas de equidade e de igualdade de oportunidades e tem um efeito negativo (no máximo nulo) como medida pedagógica, não só em termos de desempenho, mas também em termos afetivos e comportamentais.

Nesse sentido, numa perspetiva de política educativa, face ao reconhecimento da retenção como uma medida ineficaz no quadro de baixos desempenhos, colocando riscos para a equidade e favorecendo a indisciplina, é sustentável que se defenda uma intervenção no sentido de substituir, pelo menos parcialmente, a prática da retenção por medidas de combate ao insucesso, as quais poderão revelar -se mais eficazes e menos dispendiosas do ponto de vista da utilização de recursos. Esta necessidade é ainda mais premente nos casos de retenção nos primeiros anos de escolaridade, onde os seus efeitos, a longo prazo, são potencialmente mais negativos.

Diversos estudos indiciam, no entanto, que, a curto prazo e em anos mais avançados na escolaridade, em alguns casos, os efeitos da retenção podem induzir alguma melhoria no desempenho académico, embora temporária e de reduzida expressão.

Apesar dos estudos, investigações nacionais e internacionais e indicadores referirem a retenção como uma medida ineficaz e ineficiente, a cultura de retenção, ou seja, a “crença comum de que a repetição de um ano é benéfica para a aprendizagem dos alunos” (EACEA/Eurydice, 2011), está patente na sociedade portuguesa, em particular na cultura escolar.

Com efeito, é recorrente a ideia da retenção como sinónimo de exigência, qualidade das aprendizagens em oposição a um sistema “facilitista”, fomentador do desleixo, da promoção de ano sem aprendizagem. Adicionalmente, a retenção como medida de recuperação de aprendizagens está profundamente enraizada e é considerada, pelos diferentes atores educativos (professores, encarregados de educação e alunos) e pela sociedade em geral, como inerente e natural ao processo de ensino e de aprendizagem, sendo assumida, num quadro de desempenhos escolares insuficientes, falta de assiduidade e indisciplina, como a única resposta e alternativa.

A ser assim, discutir a pertinência, eficácia e eficiência da retenção enquanto a comunidade escolar estiver vinculada a uma conceção que atribui à retenção a possibilidade de melhor aprendizagem ou melhor qualidade do ensino poderá ser visto como um apelo a um sistema “facilitista” que promove os alunos não cumpridores.

No entanto, a retenção poderá constituir-se, ela própria, como uma medida facilitadora e despicienda, uma vez que, na maioria dos casos, não traz qualquer esforço acrescido por parte dos alunos, ou mesmo das escolas, que se limitam a cumprir, uma vez mais, o mesmo plano de estudos. Ao invés desta, a transição responsável de alunos com baixo rendimento escolar acarreta uma maior exigência, uma vez que pressupõe, por parte de todos os intervenientes, um esforço acrescido no desenvolvimento de estratégias e medidas de apoio e reforço das aprendizagens.

Acresce a esta reflexão o facto de a retenção ser uma medida extremamente dispendiosa, quer em termos de perda de tempo e de motivação, quer economicamente, uma vez que qualquer aluno retido equivale a um novo aluno, quando não supera mesmo o seu valor.

Estes argumentos conduzem-nos no sentido de uma mudança da cultura de retenção para o investimento em programas contextualizados de combate ao insucesso e de melhoria das condições de ensino e aprendizagem, num quadro de baixo rendimento escolar. Porém, é prudente que se alerte para o risco que poderá advir desta problemática ser analisada sob a perspetiva da redução de custos financeiros sem a correspondente aposta na implementação de medidas alternativas e contextualizadas de combate ao insucesso.

· Os dados da retenção

No quadro europeu, Portugal integra o grupo de países com maior taxa de retenção nos três níveis da CITE. De acordo com os dados do PISA 2012, dos 31 países em análise, apenas quatro apresentam valores da retenção acima dos 30 %. Nestes, enquadra -se Portugal com um valor de 34,3 % de alunos de 15 anos com, pelo menos, uma retenção no seu percurso escolar.

· O quadro normativo das condições de transição;
· Intervir Precocemente;
· Organizar a escola para o sucesso;
· Melhorar os processos de avaliação e combater a cultura da “nota”;
· Mobilizar e capacitar os Professores para o sucesso;
· Comprometer os Alunos e as Famílias;
· Recomendações;

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